Ontem ele me perguntou como é. Como é ter um bebê na barriga. A sensação. É como o quê, como você descreveria?
Largadona na poltrona, eu sorri e disse o que a gente não costuma dizer nunca, mas suspeito que comece a dizer cada vez mais, sem vergonha:
“Eu...eu não sei. Vou pensar e te digo depois, tá?”, me esquivei.
Aí lendo um post da Potencial Gestante agora vejo a frase “por mais que tente escrever, a sensação parece inexplicável”.
Às vezes enquanto desço a Augusta lembro de uma frase do Edu Cordeiro, “ele nasceu! ele é lindo, fofo, inacreditável”.
Inacreditável. Inexplicável.
Só tem um jeito de estar grávida, que é engravidando. É igual tentar descrever como é estar apaixonada. Ou descrever como é compartilhar uma refeição maravilhosa.
É igual pra todo mundo, e diferente pra todo mundo.
Eu sinto paz. Sinto que o medo ficou pra trás em algum lugar nessa floresta, enquanto eu tomava banho de cachoeira ou chupava uma manga.
É claro que às vezes aparecem uns lobos ou umas pedras, ou chove, ou o sapato se divide ao meio, mas tenho minhas artimanhas e talvez pela primeira vez na vida elas nada tenham a ver com fugas e esconderijos.
A gravidez, obviamente, te ensina a esperar. São 10 meses contando sua vida em semanas, e esperando o que vai acontecer de novidade na seguinte.
Eu acho que logo no começo você percebe que tem duas escolhas: temer ou confiar.
A gravidez é um prato cheio para potencializar medos e colorir inseguranças, simplesmente porque nunca na vida você esteve tão longe do controle de uma situação. Tem um bebê do tamanho de um gergelim dentro da sua barriga, ele vai se desenvolver, crescer, escolher a hora em que vai sair de você. E não há nada que você possa fazer sobre isso. E aí, vai temer ou confiar?
No começo, oscilei entre confiar e temer. Até que percebi que não ia conseguir curtir a gravidez se continuasse oscilando. E, de um jeito inexplicável, comecei a confiar plenamente nesse processo maravilhoso de preparar uma pessoa.
Tomei algumas medidas práticas, como diminuir a longa lista de restrições alimentares imposta pelo obstetra a dois ou três itens e parei de tirar a rúcula de dentro do sanduíche da lanchonete por medo de contaminação.
Não liguei pra quem me aconselhou a cortar açúcar e comi um docinho todos os dias com parcimônia, alguns dias com liberdade total.
Senti que a melhor coisa que eu poderia fazer pelo meu filho era me sentir feliz, e não seria feliz com tantos receios e tantas privações.
Mas a decisão mais importante, que foi relaxar o coração, não tem lá muita explicação.
Relaxei tanto que me esqueci de passar com a obstetra em julho. “Tudo bem! Mas não faça mais isso, ok? É importante a gente te examinar todo mês”.
Fui percebendo que não precisava me apegar a uma obstetra, a um livro, a um enxoval, a nada. Só preciso me sentir bem, saudável e conectada ao meu filho. Do nosso jeito.
Perguntam se converso bastante com ele, se estamos ouvindo música clássica, se estou lendo histórias.
Não, não e não. Quer dizer, do nosso jeito, fazemos essas três coisas. E acho que é isso que as pessoas dizem que é achar a sua conexão. Ela com certeza não vai ser igual a minha.
Eu e o Bento somos assim:
Todo dia, quando acordo, falo “Bom dia, Bento!”, e passo a mão na barriga. Se ele não chuta na hora – “Bentô-ô, Bentolino, Bentóviski?”, dali a alguns segundos lá vem mexida. Assim começamos o nosso dia, acordando juntos.
Ao longo do dia ele se mexe várias vezes, algumas vezes dá uns chutes (ou o que quer que seja essa movimentação) mais fortes, geralmente nas laterais, que me deixam extasiada. Faz cócegas, faz felicidade.
À tarde, no trabalho, ele costuma mexer bastante, e eu não posso compartilhar com ninguém ou dizer em voz alta “Oi, meu amor!”, mas passo a mão na barriga e estamos entendidos.
E agora a gente está entrando num novo e encantador estágio de comunicação: se eu fico um tempinho passando a mão na barriga, ele responde com chutinhos.
À noite, como eu acho que é comum a todas as grávidas, é quando o balé se intensifica. Não sei se prefiro jantar porque é hora de comer a comida maravilhosa do pai dele, ou se é porque eu sei que em instantes eu e Bento vamos conversar muito.
Tenho a sorte de ser casada com um homem que me alimenta.
De muitas coisas.
Na hora de dormir, damos os dois boa noite ao Bento, que permanece chutando as costas do pai até que a gente perca a noção do tempo e adormeça.
Faltam dois meses e meio. Ainda tem estrada.
Ainda tem muito que confiar, cuidar, viver.
Muitas augustas pra descer, muito corpo pra alongar, muita barriga pra crescer e caixa pra desempacotar.
Mas é uma delícia tão cremosa, como diz seu nonno, a gente ter chegado até aqui juntos, B., que às vezes eu me pergunto: quem está te preparando sou eu, ou quem está me preparando é você?
foto: eu, você e nosso fusca Barbecue. Créditos: Pai