quinta-feira, 28 de maio de 2009

Joaquina & Josephina ou Senta que lá vem a história ou Lar


De repente, como de repente já amava cada pintinha dele, eu estava segurando um gato. Saía de uma reunião e a cabeça ensaiava um tango, talvez uma milonga: era uma quinta-feira de pós-operatório e, de repente, já não me incomodavam tanto os pontos.

Era uma manhã clara, véspera de feriado, e eu ainda sentia o cheiro do sabonete.

Os dois estavam em cima da roda de um carro, quase escorregando para dentro da lataria. Foi ela quem viu.

Acomodei um dos gatos entre os braços como aprendi que gatos gostam de ser apartados, rindo da amiga que segurava o outro do jeito que eu certamente o faria se não tivesse conhecido Ella: como se fosse um coelho. Dois meses no máximo, pensei, vestindo o jaleco da veterinária que nunca sonhei em ser.

Jamais, jamais achei que pegaria um gato cheio de pulgas na rua e o levaria para casa. "Gatos? Não sei. São muito molinhos", já dizia a avó.

À noite, Joaquina & Josephina brincavam na mesinha da sala com o controle remoto. Um pai e uma mãe com cara de não. Mas, que fazer? Uma instituição, apenas uma, fez um preço camarada (você paga e caro para doar bichinhos de rua). Era no Campo Limpo. "Amanhã eu não trabalho, mas venho para receber as meninas", disse Rosângela, e eu respondi, toda certa daquilo: "Rosângela, que bom encontrar pessoas boas".

Naquela noite, porém, um casal viu o e-mail e ligou dizendo que aceitava as gatinhas. Graças! Quando tocou a campainha, levei Josephina à caixa de papelão e Joaquina...Joaquina? Entrou debaixo da estante. Eu tentava puxá-la e enfincava as unhinhas no chão de madeira, urrando. Minha mãe gritava "puxa!", eu gritava de volta "mãe, cuidado com a estante, você vai esmagar o gato!". Me ajuda, mãe, me ajuda, eu chorando.

Depois de 10 minutos e uma rápida ligação ao casal "desculpe, gente, já tô descendo", apareci sem Joaquina.

A cara de frustação do garoto. "A branquinha, cadê?".

Exausta, esperei o elevador, o cabelo bagunçado, mas que merda, mas que merda!

Abri a porta de casa. Joaquina dormia placidamente embaixo da mesa de jantar, como se fosse uma bola de lã argentina. Os olhos semi-abertos, essa artimanha dos gatos. Tenho certeza que riu de mim. Absolutamente atônita, sentei no chão e durante muitos minutos fiquei observando.

Ela repudiava qualquer tentativa de aproximação, feroz, mas sei que queria se deitar no meu colo. Levei-a para o quarto. Imediamente correu para debaixo da cama. Apaguei a luz e começou a miar. Acendi a luz, parou de miar e ficou me olhando, azul. Eu então ofereci: Quer subir, Joaquina? Vem? Me olhava como quem queria, sim, quero muito, e quando tentei pegá-la, se afastou. Apagava a luz e tudo outra vez, umas dez vezes. Dormiu miando. "Paciência, não é assim também com bebês?". Estava mais assustada que abelha afogada em lata de coca-cola.

Dormiu a noite calada e 15 minutos depois que despertei, despertou. Me lambendo. Ronronando. Tremendo de felicidade. Joaquina, não, você vai embora hoje! Fomos eu e a amiga que achou os gatos comigo (sim, coloquei ela na parada de novo) para o Campo Limpo, na raça. Caímos por acaso em uma clínica veterinária. É aqui que fica a Rosângela? "Não, a Rosângela fica nessa rua mais pra cima, mas, espera, vocês vão deixar essa gatinha linda no orfanato? Não, não, tem uma moça que mora aqui perto que adora gatos, vamos levar lá pra ela".

O pneu do carro furou no caminho, e nós rimos. Tudo parecia tão certo.

A mulher não estava na casa e o calor estava de derreter. "A tia dela mora nessa rua, vamos perguntar qual é seu celular!". Conseguimos o celular, ligamos. Ela estava em um culto e chegaria em 15 minutos. Ei, aquele moço é forte, ei, moço, ajuda a gente a trocar o pneu? "Tem algum lenço para limpar a mão?". Tem meu cachecol.

E a moça chegou à clínica. Era japonesa e tinha voz rouca de cigarro. Abraçou Joaquina e Joaquina se enroscou em seu pescoço. "Ô, meu amor, você quer ficar comigo?". Nós, as boas samaritanas, nessa altura em estado constante de riso, meio que voltamos ao normal. Então acabou?

"Me veio um nome à cabeça. Kira. Você vai se chamar Kira", disse a japonesa.

Kira, em árabe, é rainha.

Ê, Joaquina, sua pilantra de primeira categoria! Aposto que rapidinho deu um chega pra lá naqueles dois cachorrões da casa.

Um comentário:

Bi disse...

Adorei Nanits! Espero mesmo que a Joaquina tenha dado um baita chega para lá naqueles bichões enormes... Bom, conhecendo a figura, não tenho dúvidas de que isso aconteceu! Bjos