quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

acaso


Chegou com seus olhões azuis, sorriso espaçoso e um cardápio em mãos. Ei, eu conheço você, você é o Leandro do Lar São Tiago. "Sim!" Leandro, eu já te vi uma vez, você trabalhava como garçom em outro restaurante, eu te vi quando estava jantando com a minha família..."Sim!". "E agora,", ele disse, cheio de orgulho, "eu tenho uma filha".
Almocei lembrando com uma delicada nostalgia das idas ao orfanato no Jardim Ângela. Foram seis anos de visitas irregulares aos sábados que me deixavam extasiadas e completamente exausta. Eu, uma criança de 13 anos, tentando entender o mundo de Cibele, o mundo de Bianca, o mundo de Bia, Beth, Felipe, d. Maria.
Acabei o sanduba e fui sentar na mesinha de fora quando ele apareceu, todo sorriso largo. "Pode deixar, vó, eu não vou dirigir à noite", garanti à dona Teresinha pelo telefone enquanto ele colocava na mesa uma xícara de café e dois Dadinhos.
Mostrou foto da filha de 2 anos no celular (foi-se o tempo das fotos nas carteiras...) e citou uma lista de nomes de seus antigos colegas do Lar São Tiago. Eu não lembrava de metade, mas sorri, como se sim, e ele me contando que rumo tomou cada um. "Lembra daqueles três irmãos? Eles morreram...". E a Cibele? "Tá linda, desse tamanho!". Tem alguns que foram para "o caminho do bem", outros "se perderam...".
Uma vez, levamos as crianças para Santos de busão. A maioria nunca tinha visto o mar. Choveu horrores no dia, mas eles nem ligaram. Lembro da excitação da Bia correndo na beira daquelas águas amarronzadas. Foi provavelmente um dos dias mais emocionantes da minha infância.
Alugávamos um sítio em dezembro para a Festa de Natal e as crianças ficavam enlouquecidas com a piscina.
A Cibele, minha melhor amiga, menina negra e enérgica que falava com a língua presa, colocou maiô, mas não queria sair do quarto. Dezenas de pessoas ao redor dela, tentando convencê-la, vamos lá, Cibele, vamos nadar. Como um tatu-bola, Cibele se fechava quando tinha muita gente por perto.
Depois que saíram do quarto, me deu a mão e fomos juntas para a piscina. Nadou até a mão enrugar.
Leandro me agradeceu, disse o quanto nossas visitas ao Lar São Tiago foram importantes para ele. Eu previra que me agradeceria, e gostei demais, não por vaidade, mas porque descobri que agradecimento com uma década de atraso tem ritmo de poesia.

4 comentários:

Anônimo disse...

"Mãe, manda um beijo na Nana por mim".

Ok Helena, missão cumprida!

Luiz Sonda disse...

então, gostou de tramandaí?

nana tucci disse...

pô, careca, achei que fosse te encontrar na Sociedade dos Amigos de Tramandaí! hehehe. Adorei...ontem fui numas dunas entre Tramandaí e Cidreiras, lugar espetacular!

Luiz Sonda disse...

ative sua máquina do tempo, volte exatos 30 anos e vai me encontrar lá comprando uma camiseta G! hehehe abs