quarta-feira, 18 de abril de 2012

suspiros de abril



O doce reina solitário na família, não há outro capaz de superá-lo. Musses, abóbora, bolos, todos ótimos, acontece que o doce de morango é o céu. Os tios pegam a tigelinha e, como formigas atrás de açúcar, se posicionam em um lugar próximo à travessa antes de a mãe decretar "podem servir a sobremesa". O negócio é tão sério que Teresinha não libera o doce sem a presença dos tios. Na hora de se servir, todos os integrantes da família sabem o segredo: mergulhar a colher com firmeza nas nuvens brancas, de modo que o doce de leite da camada mais profunda seja raptado em abundância. Como escreveu o Mário Bortolotto hoje em seu Face a respeito de um risoli, posso morrer depois de uma colherada dessas. Sério, estaria pronta caso a morte chegasse, com os queixos melados de suspiro e um delicioso hálito de leite. Bom, pensando em uma sobremesa que a amiga que tá sem comer leite pudesse saborear, cheguei ao suspiro (ok, tem doce de leite, mas como fica só no fundão, dá pra passar sem ele). Só que fazer um suspiro pela primeira vez numa terça à noite sem um plano B tendo as amigas como cobaias, e logo o mais difícil deles, o italiano, não parecia sensato. Mas o dia corria tranquilo dentro de mim. "Vó, vou fazer seu suspiro. Me fale, vamos lá, como eu começo?". Todo mundo sabe que vó nunca começa pelo começo, é sempre pelo meio, adoráveis avós, e de repente aparece o fim, aí no fim...ah, o começo. Do nosso jeito nos entendemos e desligamos o telefone. De cara já estranhei por não ter me intimidado com a calda de açúcar, que já errei, em outros doces, pelo menos umas cinco vezes. Que satisfação foi ver pela primeira vez a clara, aquela coisa babosa e incolor, se transformando em nuvem! Acertei o ponto da calda e incorporei-a direitinho às claras. Quando enchi uma colher e senti o gosto do suspiro da vovó, exultei. Senti uma alegria genuína. "Porra, foi tão bom, ou quase, quanto encontrar o Bob Dylan em Copacabana!", eu disse a ele, que riu incrédulo. Entenda, eu expliquei, para mim o doce de morango nascia pronto, acabo de desvendar o mais doce mistério da minha infância. Tudo correu tão bem que a sobremesa já estava na geladeira e a louça toda praticamente lavada quando a primeira amiga chegou. Ao telefone, gritando de satisfação com vovó, ouvi: "É difícil fazer esse suspiro. Se errar a calda, para menos ou para mais, não sai. Você leva jeito". Tô me achando, só por hoje.




2 comentários:

Anônimo disse...

Voce herdou a arte de cozinhar da Teresinha....vale ganhar uma batedeira bem linda! Vou tentar...depois te conto! Tia Re

Talita Nozomi disse...

Vc é incrível Nana!!! Tão mulherão!!! Vê se não esquece... rs
beijinho bem docinho!